segunda-feira, 19 de novembro de 2012

Trecho: À Sombra das Raparigas em Flor


 "Um mundo novo que não subsistisse nada do antigo, nada... a não ser uma coisa: gue Gilbert me amasse. Compreendi que se meu coração ansiava que em torno dela se renovasse aquele universo que não o satisfizera, era porque ele, meu coração, não havia mudado, e pensei que tampouco havia motivo para que tivesse mudado o de Gilbert; que aquela amizade era a mesma de antes, como acontece com os anos novos, que não estão separados dos outros por um fosso e que o nosso desejo, impotente para chegar até as suas entranhas e modificá-los, reveste, sem que eles o saibam, de um nome diferente. De nada servia que eu dedicasse a Gilbert aquele que começava e, como se superpõe uma religião às leis cegas na natureza, tentasse imprimir ao primeiro do ano a ideia particular que formava a seu respeito; tudo em vão; senti que ele não sabia que o chamávamos o dia do ano novo, que ele expirava no acaso de um modo que não era novo para mim; e no vento suave que soprava em torno do mostrador, vi reaparecer a matéria eterna e comum, a umidade familiar, o inconsciente fluir dos dias de sempre."

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